quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Sobre Mosca e outros Seres Asquerosos


O texto abaixo é de autoria de Marco Tanoeiro, e foi publicado em seu blog http://blogdotanoeiro.blogspot.com/2011/10/sobre-mosca-e-outros-seres-asquerosos.html . Ele vem ao encontro do que este PadariaPost tem defendido: a separação total dos negócios da religião - sejam quais forem - do Estado, que é laico. 


SOBRE MOSCA E OUTROS SERES ASQUEROSOS

Padres deveriam cuidar de suas igrejas! E só! 

Zelassem os clérigos pelos princípios básicos da moral e dos bons costumes e não teríamos a igreja envolvida em tantos escândalos.

No entanto, talvez pela ânsia desenfreada de controlar a debandada de fiéis para outras religiões, os líderes católicos passaram a trilhar outros caminhos, muitos deles tortuosos até para quem os conhece bem, que dirá para esses verdadeiros rábulas de batina.

Dia desses um conhecido pároco de Suzano, na grande São Paulo, resolveu dar seus pitacos sobre a saúde local, demonstrando uma ignorância sobre a matéria dignas de... um padre! 

O pior é que resolveu fazer isso por meio de artigo, publicado em sua coluna habitual, em um dos jornais de maior circulação na região do Alto Tietê.
Eis que, hoje pela manhã, me deparo com um texto de Leonardo Sakamoto, publicado em seu Blog, que se encaixa como uma luva no caso em tela.

Mesmo sem conhecer o padre suzanense (na verdade italiano) posso dizer sem medo de errar que o texto do Sakamoto é um daqueles tiros em que se acerta na "mosca".

Segue o texto na íntegra.


Que tal entregar a saúde pública à igreja? 

por Leonardo Sakamoto*


O reitor do Santuário Nacional de Aparecida pediu ao ministro da Saúde que não distribua camisinhas nas escolas públicas, afirma o Painel da Folha de S.Paulo de hoje.


Sabedoria divina que arrepia. Até porque, como todos sabemos, jovens só fazem sexo por causa do preservativo grátis. Sim, ela, a camisinha, é a responsável por tirar da inocência milhões todos os anos. Sem a dita, viveriam uma vida de castidade, dedicada às boas causas. Mas não! Enquanto o pecado em forma de látex lubrificado estiver à espreita de nossos adolescentes, feito o Tranca-Rua, o Tinhoso, o Cramulhão mangando Jesus no deserto, não haverá paz.


E o Estado, ao distribuir essas sementes da luxúria, é como a serpente que ofereceu o fruto da árvore proibida à Eva, levando ao conhecimento do bem e do mal. Pobre Adão! Pobres rapazes tirados da castidade por culpa de garotas que repetem o pecado original!


Sem esquecer dos padres acusados de molestar sexualmente de crianças, levados à tentação por conta de anúncios libidinosos de preservativos.
Malditas sejam todas as camisinhas! Antes delas, não havia sexo antes do casamento, muito menos cópula que não fosse com o sagrado intuito da procriação.


Com base no doce raciocínio do clérigo, proponho algo revolucionário: fechar as fábricas de preservativos. Jontex, Olla, Preserv, Blowtex… Isso acabaria com todas as doenças sexualmente transmissíveis, como a Aids, noves fora os filhos indesejáveis.


Enfim, vamos entregar a questão da saúde pública aos cuidados da Igreja Católica. Certamente, ela terá a coragem de pôr em prática ações que o Estado não toma.


Os problemas sociais serão resolvidos com base no Código de Direito Canônico e, por que não, na reedição da bula Cum ad nihil magis, do Santo Ofício. Por exemplo, condenar médicos que fizerem abortos, mesmo que nos raros casos previstos em lei, a uma eternidade de privações no limbo – já que não se fazem mais fogueiras em praças públicas como antigamente – vai por um ponto final na questão.


Revolucionário, nesse sentido, foi o então arcebispo de Olinda e Recife José Cardoso Sobrinho, que excomungou os médicos envolvidos no aborto legal feito por uma menina de nove anos, 1,36 m e 33 quilos, grávida de gêmeos do padrastro que a estuprava desde os seis anos de idade. 


“O adulto, quem aprovou, quem realizou esse aborto, incorreu na excomunhão. A Igreja não costuma comunicar isso. Agora, a gente espera que essa pessoa, em momentos de reflexão, não espere a hora da morte para se arrepender”, disse em 2009. Amém.


O mesmo vale para o uso – e, quiçá – distribuição gratuita de preservativos. O arcebispo da Paraíba, Aldo Pagotto, suspendeu o deputado federal e padre Luiz Couto (PT-PB) de suas funções como sacerdote porque ele defendeu o uso da camisinha e os homossexuais.


Enfim, tudo isso seria engraçado, apenas fait divers em colunas de jornais se, em épocas de eleições, os candidatos não vendessem sua alma à igreja na busca por votos, prometendo em troca a manutenção do controle simbólico sobre o corpo dos cidadãos.


* Leonardo Sakamoto é jornalista e doutor em Ciência Política. Cobriu conflitos armados e o desrespeito aos direitos humanos em Timor Leste, Angola e no Paquistão. Professor de Jornalismo na PUC-SP e ex-professor na USP, trabalhou em diversos veículos de comunicação, cobrindo os problemas sociais brasileiros. É coordenador da ONG Repórter Brasil e seu representante na Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo.


http://blogdosakamoto.uol.com.br/2011/10/13/que-tal-entregar-a-saude-publica-a-igreja/




domingo, 2 de outubro de 2011

Carnaval em Pernambuco: quem ama, cuida


PadariaPost traz uma reflexão que vale não apenas para o Carnaval do Recife, mas para todas as manifestações culturais deste país multifacetado. 
Silvana Viana Torres
Lendo o blog, na manhã deste 10 de março, tive a grata surpresa de me deparar com o que escreveu um leitor atento sobre o processo de privatização do nosso carnaval.
No último dia 24, a escritora Célia Labanca, em artigo publicado na Folha de Pernambuco (Responda quem souber), também chama atenção para o fato. Concordo com os dois. Passei o carnaval, pela primeira vez, sem brincar, apenas observando e acompanhando a cobertura da imprensa pela televisão e pela internet. Em nome da Multiculturalidade o carnaval de Recife vem sendo transformado em um grande festival de musica como esses que acontecem em várias cidades mundo afora.
Não é de hoje, vale ressaltar.
Mas, agora em 2011, chegamos ao extremo. Doía ver o carnaval, pela oitava (?) vez ser aberto com Naná Vasconcelos e seus batuqueiros e de quebra um show produzido por Lenine, supostamente em homenagem à nossa presidenta, com várias cantoras, todas ótimas, é verdade, cantando musicas de seus próprios repertórios, de Roberto Carlos e por aí vai. No show, apenas Nena Queiroga honrou o carnaval de Pernambuco. Nada contra Naná, ao contrário, mas na terra do Frevo - queiram ou não – por que o carnaval não ser anunciado pelos clarins e aberto por 400 metais? Esse absurdo, que dizem ser tradição, chegou ao seu máximo no carnaval dos 100 Anos de Frevo. Naquele ano foi indigesto ouvir a grande Maria Bethânia abrir o carnaval dos 100 Anos do Frevo, cantando uma “loa” acompanhada pela percussão de Naná.
Sempre entendi que nosso carnaval é multicultural. Senão, vejamos. Temos o frevo - ritmo e dança - com seus inúmeros blocos ; os maracatus de Baque Virado e de Baque Solto; os caboclinhos; as cirandas; as escolas de samba; as la ursas; os bois; o cavalo marinho (o sobrevivente é do município de Aliança), os caretas, os bonecos, os papangus e outros. Mas, onde estão mesmo as tradicionais agremiações do nosso carnaval? Como sobrevivem? Com os parcos recursos liberados pelo poder público nas vésperas do carnaval?
Quanto ao frevo, aquele que “entra na cabeça, depois toma o corpo e acaba no pé” , é ele, sim, o responsável pela alegria do nosso carnaval. É ele que andam fazendo questão de rebaixar, em nome da Multiculturalidade, a despeito de hoje ser Patrimônio Imaterial.
Lembrem que a PCR até mudou o Concurso de Frevo. O que já não era bom, hoje se chama Concurso de Música Carnavalesca, incluindo maracatu, caboclinho etc... Com qual desses ritmos nosso estado e nossa capital são identificados mundo afora? Alguém já ouviu falar de uma pessoa adquirir um disco com esses ritmos, seja para ouvir ou dançar? Mas todo mundo sabe de alguém que tem discos de frevo. E na folia, em casa ou na calçada, no carro, durante o carnaval, é o que se ouve. Culpam as emissoras de rádio por não dar espaço às novas composições. Não sei esse ano, mas em 2010 o disco do tal festival foi lançado depois do carnaval.
O que assistimos, hoje, algumas pessoas inconformadas, é a mais completa descaracterização do carnaval pernambucano. Ao contrario do Rio de Janeiro, que vem, a todo custo, tentando resgatar sua folia de rua, promovendo concurso de marchinhas, com dezenas de blocos sendo criados, Pernambuco e sua capital seguem jogando valiosas tradições no lixo.
Seja o poder público promovendo shows nada a ver com o carnaval; seja a imprensa em êxtase com o movimento de “celebs”, em luxuosos camarotes tipicamente baianos; sejam os ditos “produtores culturais”, com seus carnavais de trios elétricos, hoje até em blocos de bairro, como acontece há dois anos com o Bloco do Oiti, no Espinheiro. E, pasmem! Até a escola infantil, Saber Viver, na semana pré carnavalesca, botou seu bloco de crianças atrás de um trio elétrico, desfilando pela (ainda arborizadas) ruas do Espinheiro – cena bizarra, que dispensa maiores comentários, até por ser uma escola que, em tese, deveria repassar nossa cultura às suas crianças. Uma orquestra de frevo ali e estaria tudo maravilhoso.
Passado o carnaval, resta-nos as felizes declarações das pessoas que comandam o turismo em nosso estado e daquelas que se intitulam “produtoras culturais”. Todas felizes com a ocupação de 99% da rede hoteleira, regozijadas com o lucro e o sucesso do Festival Multicultural. Desculpe, carnaval.
Mas, olha aí a brecha: vocês, produtores ,têm espaço no nosso calendário para fazer um evento dessa natureza - o começo do verão. Por que não um Rock in Capibaribe? Invistam, ousem, arrisquem seus ricos dinheirinhos, corram em busca de patrocínios. Preencham o calendário de festas da nossa Capital Multicultural. Hotéis lotados, empregos gerados, dinheiro no bolso ,em outro período do ano. Mas, preservem o Carnaval de Perambuco, único pela sua diversidade cultural. E, como disse Célia Labanca em seu artigo, citando Tolstoi: "Se queres ser universal, canta bem a tua aldeia"